Quando é amor, nunca temos certeza. Os indícios apontam, os ânimos se exaltam e o corpo responde. Eu te disse que dessa vez seria amor. Talvez você estivesse predestinado, mesmo não acreditando que amor não seja ato do destino, mas da energia de quando se quer amar. E dessa vez você queria. Das outras vezes o amor era tanto que nem conseguia ser amor. Em um dos casos, o alicerce do relacionamento era a carência, a vanglória, a dependência psicológica de ambos. Não era amor, não era amar, eram pequenos luxos materiais conciliados com a falta de um sentimento real. A luxuria e a falta não se relacionam com o amor. Em outro momento, em outra pessoa, encontrou-se o amor na fraqueza emocional. A personalidade desviada, a crise de identidade e a inconstância do ser deram o suporte a esse relacionamento. O amor era pautado em uma mente debilitada, que sugava as emoções de terceiros para enganar as próprias. No final, a matéria ficou em dívida e a alma levou a culpa. O erro de quem julga que ama é culpar o amar. Neste momento, sem muito ver e sem muito especular, só posso dizer que é amor. A carência foi traduzida em companheirismo, o luxo em simplicidade, a falta de identidade em personalidade, a dívida em crédito, a culpa em conformismo, o amor em amar. E se é amor, jamais terei certeza. Mas que se está amando, isso não há como errar.

Quando a gente caminha,
lado a lado,
sem muito que dizer.
Tem que ser domingo,
deve ser amor.
Preso na hora,
preso no momento.

E chegamos a nosso destino,
o meu de partir,
o seu de permanecer.
O amor fica lá,
preso na lacuna entre nós dois,
como um artefato,
como um monumento.

Desacredito em todas as cartas de amor. É um monte de papel, um emaranhado de palavras e mentiras muito bem colocadas na ponta de uma caneta de cinquenta centavos. São folhas que causam comoção momentânea e que depois vão para uma caixinha esquecida no guarda-roupa, para o lixo. Mas, antes de ser tanto e tão pouco, cartas de amor são falsas profetas. Quem as escreve, acredita que o sentimento temporário vai equivaler para a vida. Acredita que amar é congelar um momento, transformá-lo em eternidade através em um pedaço de sulfite. Acredita que o segundo é permanente e que o êxtase é etéreo. Cartas de amor não têm o dom de prever o futuro. São cegas pela razão que assola quem as escreve. O sentimento, forte e consistente, tem validade. Pode-se amar para sempre, mas a forma de amar não é eterna. O amor evolui, contrai, expande, retrai, toma forma, ganha força, perde espaço, não se sabe. Amor não é amar, amar é peculiar. Nunca acreditei em cartas de amor, pois acredito que amar não é um momento de efusão. Quem escreve uma carta, escreve um momento. Quem descreve um momento, deixa a mente esboçar as reações do passado e as compara com o presente. O presente de uma carta de amor é um derrame de emoções, é serotonina traduzida. Não escreva sobre o presente, sinta-o. Cartas de amor são sinestésicas e a sinestesia vai embora após o ponto final. O sorriso de quem lê uma carta de amor dura o tempo exato da lembrança da mesma. O sorriso de quem ama dura para sempre. Cartas de amor são traiçoeiras. Aos que amam e não são mais amados, estas se tornam álibi contra quem escreveu. Para quem deixou de amar, cartas de amor são vestígios de hipocrisia. Para quem ainda ama e as escreveu, se transformam em máquinas de criar dor. Não acredito em cartas de amor, acredito em quem ama. O amor não cabe em um pedaço de papel, é intangível. O amor não cabe em um pedaço de papel, cabe em você.