Somos positivamente conflitantes e sempre seremos. Eu não vivo sem você e você não você sem mim, independente de qualquer sentimento. Estamos em sociedade, logo até a individualidade é coletiva. Sendo assim, amar é coletivo: dependemos do amor dos outros para existir. É aí que entra o problema, o meu e o seu. Uma relação é feita de doações, do que parte de mim para você e do que parte de você para mim. Quando nos colocamos no meio das relações cotidianas, como deixar de fazer algo que gostaríamos para fazer algo que o outro gostaria, vivemos a coletividade do amor. Mas quando o seu eu entende que a doação tange a um universo de coisas que só você gosta e eu não, ou quando antes de pensar em você eu penso em mim, não há coletividade, há egoísmo. Amar não é egocentrismo, amar é ceder. E alguém tem que ceder para um dos “eus”, senão a coletividade jamais existirá, o individual tentará seguir sem sucesso e vamos quebrar a regra social do amor. Não que para amar existam regras, mas para não deixar de amar o meu ou o seu eu, existem. Quando um de nós anula o próprio eu, não existe mais coletivo, já apenas um irá se sobressair e uma relação de um só deixa de ser coletiva, torna-se individual e automaticamente egoísta. Se você acredita no amor, passe a pensar mais em mim do que em você e viva nós dois. Se você acredita em você, em mim e no amor ao mesmo tempo, esqueça um dos três.

Só se sente arrependimento quando se gosta, mas se arrepender é relativo. Só se gosta quando o outro se faz envolver, mas o envolvimento morre quando não há mais interesse. Só há interesse quando uma das partes tem algo a oferecer, mas o oferecimento é benefício de quem tem muitas qualidades. Só há qualidades quando existe empatia, mas só se é empático quando a importância do outro é equiparável a sua. Só há empatia, qualidades, oferecimento, interesse, envolvimento, gostar e arrependimento quando existem duas pessoas. Quando uma sente mais do que a outra, só se há, nunca se é.

Todo relacionamento é uma troca, mas sinto que estou sendo defasado. Na escola do amor eu sou o professor, você é estudante e eu só queria me aposentar, mas sou jovem demais para isso. Deixar de dar aulas e quem sabe fazer uma pós-graduação, aprender mais sobre esse sentimento que enriquece a sua alma e me deixa cada vez mais atrasado em relação a ele. Estudar mais o comportamento das outras pessoas, sofrer com professores qualificados, ficar de DP e quem sabe tirar dez no trabalho de conclusão de curso.

Quero reclamar na diretoria, mas a educação está cada vez mais precária e bons professores não tem para onde ir a não ser para a sala de aula. Tenho que me contentar em abrir a cartilha todos os dias e ensinar o bê-á-bá de como ser alguém quando se está amando. Dizer que é preciso guardar os finais de semana para os amados, que não se pode flertar com as pessoas na rua e que traição é expulsão da escola na certa. Explicar que de vez em quando é preciso deixar o outro escolher qual prato preparar, um filme ou uma sorveteria é obrigatório, senão você é taxado de egoísta. Lecionar sobre romantismo – não o da escola literária – e de como palavras repletas de carinho e afeto são necessárias para passar de ano.

Acredito que devo parar com as aulas de história sobre nós dois. Parece que a sala fica vazia quando comento sobre as guerras que passamos, quais vencemos e quais perdemos. A geografia do que nos sustenta também já está complicada, pois passamos por um longo período de seca. Você não consegue entender a matemática da nossa relação e não compreende que a regra de três não é aplicada a triângulos amorosos. Só queria que você tivesse ciência de tudo o que sinto e conseguisse colocar em prática.

Preciso de férias, mudar de escola, encontrar novos alunos. Sempre me disseram que professor ganha mal pelo que faz e eu nunca quis acreditar. Cansei de ensinar sobre o amor para quem só sabe cabular aula.