Estou há um tempo aqui neste trem – que me disseram ser o do amor – e já não vejo a hora de descer. As janelas fechadas com todos respirando o mesmo ar, pessoas de cara feia, encoxadas e esse trem velho e sujo não pode ser feito de amor. Não dá para se sentir feliz e muito menos amado aqui dentro.

Quando embarquei no trem, não tive escolha. Havia muita gente atrás, me empurrando, sem saber se eu queria entrar ou não. Na plataforma do amor não existe horário de pico, toda hora é hora de embarcar. Está sempre lotada. No trem dos relacionamentos não existe assento preferencial, quem chega primeiro vai acomodado o caminho todo. É por isso que as pessoas se digladiam para entrar. Não importa se alguém vai cair nos trilhos, morrer ou se machucar, o importante que você vá confortável, o outro que se foda. E eu me fodi. Só queria ter esperado um pouquinho a aglomeração passar. Juro que deixei as portas livres e aguardei no cantinho para que as pessoas saíssem antes. Para descer para a plataforma, deixei a esquerda livre. Definitivamente eu não devia estar aqui dentro.

Até agora ninguém saiu do trem. Está lotado de gente apaixonada, amando loucamente como se fosse a coisa mais maravilhosa de todo o cosmos. O trem balança demais e eu estou enjoado com tanto amor. Não vejo a hora de chegar na próxima estação. Esperei o trem partir para descobrir que não queria embarcar. Demorei para descobrir que amar não é partir, é chegar. Ainda vou amar, mas por outro caminho.