Sou eterno. Não existe parte minha que não seja do mundo e mundo que não seja meu. Quando eu partir, fechar os olhos e deitar com a escuridão, farei parte de outros universos, outros seres, outras ocasiões. As feições e a carne ficarão presas na madeira, e a minha existência será sufocada pela terra. Apesar de tanta dor, não sentirei nada. Não sentirei que já fugi de mim e fui para outro canto. Quando você não é mais você, você pode ser tudo. Ao morrer, um fragmento da sua vida dá origem a outro. Ao partir, você não se vai por completo. Além de ficar nas lembranças de quem vive, algo quase invisível permanece. Ao morrer, o ínfimo se torna etéreo e dá vida a uma nova vida. Talvez eu nem seja tão grandioso, como quem se torna um cachorro de raça. Acho que o meu menor fragmento tem cara de hortelã ou de erva-cidreira. Vou me tornar chá e todo mundo vai beber um pouco da minha alma. Talvez eu me torne um pomar, uma laranjeira ou uma videira, e o mundo vai me consumir aos poucos, até que eu me acabe em folhas para nascer de novo. Talvez eu me torne terra, para abraçar velhas existências e dar vida a novas.