As fronteiras estão delimitadas neste território que eu não posso sair. Confesso que já tentei. Já escalei as muralhas, enganei os guardas, fiz greve de fome, bati com a caneca nos portões implorando por glória, mas sem sucesso.

É um estado capitalista, que vive o regime da oferta e da procura, e sou socialista, gostaria de tudo igual, para todo mundo.
Não sei se pequei para estar aqui dentro, mas estou. Aqui, cada pessoa concebe um tipo de sentimento. Alguns acreditam ser um lugar incomparável, e eu não vejo nada além da obrigação de viver neste espaço. Gostaria de ver o que está em minha frente, não essa neblina que encobre a minha visão.

Provavelmente há pastos verdes e flores coloridas, como já nos disseram. São diferentes concepções de uma só, e uma hora todos vão conceber algo aqui dentro. Estou inapto de gerar algo que não parte de mim.

O amor é um estado de espírito que eu não posso conceber.

A gente passa a vida buscando o melhor para a gente. O melhor da escola. O melhor amigo. O melhor da turma. O melhor filho. O melhor namorado. O melhor. Nos dedicamos a dar o máximo de nós e poucas vezes é porque queremos. O nosso melhor é o que os outros querem. É preciso estar disposto, com um sorriso estampado, cabelo arrumado e roupa sem amassos. É preciso efetuar as tarefas com maestria, ser competente, dar o exemplo. É preciso sobressair a si mesmo.

No meio do caminho a gente descobre que a gente nunca foi da gente. A gente é dos outros e esperto que é dono de si próprio. Quem sorri para dentro, sorri para as próprias escolhas. Os sem rumo estão mais encaminhados do que nós, presos no destino traçado por alguém que pouco nos interessa.

Continuo sendo o melhor, mas só por hoje. Ainda estou com preguiça de ser meu.

Eu não preciso me afirmar a todo momento, mas faço. Me pego constantemente em provação, criando provas mentais para disputar comigo mesmo, criando intrigas fictícias com pessoas que pouco me acrescentam e muito me incomodam.

Necessito de aprovação. Apesar desta ser dos outros para mim, o maior juiz é a minha mente. Ela precisa de tudo perfeito, construído, calculado, impecável. Se eu arquiteto algo, quem constrói é a mente. Ela encaixa as peças, coloca de pé e dá sentido, mas tira o meu. Sinto que nunca sou bom o suficiente para mim e consequentemente para os outros. É como se todas as mentes se reunissem no inconsciente coletivo para falar de mim. É presunção demais imaginar que o mundo está pensando sobre você, suas atitudes e comportamento. Infelizmente a minha mente é presunçosa.

O fruto desta conduta é pensar que todos aparentemente fortes estão contra mim. Na verdade, a força é apenas uma bengala para criar uma personalidade dura, mas no fundo sei que estes que teoricamente me julgam sofrem mais do que eu. O que os outros veem é a casca. O que eu vejo é a fragilidade do ser envolto por esse lacre. As pessoas que usam máscaras como artifício para seguir com a vida de forma mais natural são as mesmas que precisam dos que precisam se provar. O alicerce de uma alma frágil é a mente de um alguém que extrapola os próprios limites. E é exatamente por isso que os que pouco me acrescentam muito me incomodam, pois precisam do meu juiz mental para fortalecer o próprio desespero.

Naufrago em meu próprio juízo, afundo em minhas cobranças, me afogo no que os outros estão pensando. Não preciso me provar, mas me provo, com a esperança de ser o melhor para mim.