Tudo gira em torno do que não estou vendo. A insegurança, o receio e o medo estão intrinsecamente atrelados a ideia de que se não está sob meus olhos, significa que está acontecendo.

A insegurança me assola o tempo todo. Ela dita as regras. É como um órgão regulamentador de problemas existisse dentro de mim e dissesse o que devo pensar e como devo agir diante de determinadas situações. Esse órgão faz questão de mostrar que você está fazendo algo errado neste exato momento, que está traindo a minha confiança, que me engana, que dissimula.

O receio não me deixa seguir adiante. Ele diz, boa parte do tempo, que não vai dar certo, que não adianta tentar, que não sou bom o suficiente, que sou uma farsa. Ele indica que estou me premeditando e se depender do futuro, é melhor ser refém do presente.

O medo bloqueia. Ele instiga o pior. Ele me defende em um lugar onde estou seguro. Eu sempre estive seguro, até o medo chegar. Ele desestabiliza os meus sentimentos, desnorteia, desgasta, corrói. O melhor lado de mim se torna negro. Se tenho certezas, o medo me coage a duvidar.

E sigo cego de medo, de insegurança, de receio, a ponto de nenhum cão guia querer me guiar. Tudo gira em torno do que não estou vendo, e não estou vendo que assim não é possível evoluir, ser feliz.

Mal sabe
que saber muito,
mau é.
Saiba de nada,
duvide de tudo,
perca a fé.

A coisa parou de andar. Não sei explicar muito bem, mas até vou tentar. É como estar aproveitando a praia num dia ensolarado qualquer, entrar no mar, começar a nadar para frente e a maré te puxar. É bem parecido também quando você sai disposto pela manhã, mas fica algumas horas no trânsito, parado, inconsolável. Nesses casos, não há muito o que fazer a não ser aguardar a maré estar a seu favor ou o trânsito fluir. Como eu disse, não sei explicar muito bem e de fato não consegui, pois ao contrário do oceano e do congestionamento, não tenho visto nenhum progresso. Aliás, tenho visto algo sim, mas é regresso.

Tenho me sentido com cinco, seis ou sete anos, na época que eu imaginava que quando todos em casa já estivessem dormindo, no meio do breu, apareceria um monstro. Sentia medo, mas nunca vi o tal do monstro, honestamente. Hoje é meio parecido, só que as luzes estão acesas, mas o monstro continua invisível. Sei que quando eu era criança o monstro era apenas uma pulsão, minha imaginação trabalhando a forma com que eu devia encarar o escuro e o fato de ficar sozinho. Hoje o monstro não faz parte da minha pulsão. Ele é impulsionado pela pulsão dos outros que me cercam. Sou eu, administrando o monstro dos mais diversos sentimentos alheios, criando um só para mim.

A soma dessas energias só me faz pensar em uma lenda chamada “Cabeça de Burro”. Ela conta que um lugar não progride se há uma cabeça de burro enterrada no local. É o meu monstro e o dos outros. Sinceramente, eu já identifiquei a cabeça de burro – ou as cabeças. Aliás, quem enterrou a cabeça nesse lugar, se um dia precisar de dinheiro como coveiro, morrerá de fome. A cabeça está ali, aparecendo. Todos estão vendo, mas ninguém faz nada.

Se estou prostrado, a culpa é da cabeça de burro. Tenho visto várias, mas não posso desenterrá-las. As cabeças estão vivas, com tronco e membros, mas os donos das cabeças preferem mantê-las embaixo da terra por ser mais confortável. Burros.