Estamos prontos para o fim. Não nos preparamos, mas sinto que marcamos a hora do enterro, para não perdermos a oportunidade de um olhar para o outro dentro do caixão.

Nos cruzamos pelo caminho e paramos em uma encruzilhada. Decidimos seguir juntos para um dos caminhos, sendo que cada um gostaria de ir para um lado. Estamos caminhando de mãos dadas, mas sofrendo com a pressão dos dedos. Você me segura e eu quero partir. Eu corro e você prefere andar. Você me puxa e eu só quero ficar parado um pouco. Eu te sinto longe e você me enxerga perto.

Estamos presos em um amor condicionado. A gente se ama na rotina e se odeia no inesperado. Preferimos o arroz com feijão ao invés de não ter prato preferido. Estamos em um ninho, mas com asas prontas para serem gastas. Nós somos paixão se esforçando para ser amor.

Entretanto, foi tanto de nós para os dois que nos sobrou pouco para nós mesmos. Já não temos mais a essência própria e o pouco que sobrou não nos basta. O amor se tornou líquido e a escassez está nos deixando com sede. Estamos morrendo, ao poucos, sem poder regar o melhor da gente.

Chegamos no dito final. Não temos mais nada, a não ser um ao outro. Enquanto existir vida, haverá morte. E se a vida a dois mata a própria vida, a melhor escolha é morrer. Não de amor, nem por amor. Melhor morrer por causa do amor.

Eu não preciso de óculos para decifrar as letras miúdas que encontram-se em seu rodapé. Consigo descobrir o que significa cada palavrinha, cada vogal e consoante perdida entre um sorriso e uma bronca. Consigo saber exatamente o que você deseja só de te olhar, sem precisar te abrir.

As suas entrelinhas são um prazer para a minha leitura. Através delas descubro por quais caminhos seguir, o que te aflige, como podemos caminhar para a felicidade. Você é o prefácio da minha vida. Por mais intangível que seja um sentimento ou uma emoção, consigo descobrir através do glossário que se esconde em seus olhos.

E cada vez que passamos por uma livraria, me pergunto: por que comprar um livro se eu posso te ler?

“Trabalhe com o que você ama e viva de férias”, dizem. Mas o amor nunca sustentou uma relação sozinho. Ele soma, mas sem suporte amor é apenas mais um sentimento.

Ame o que você faz, mas não ame apenas. É preciso se organizar. O amor sustenta, mas sem organização uma hora você poderá morrer de fome. Planeje, encontre formas e formatos. Estar alinhado com o que você gosta é um modo de prolongar o prazer de fazer.

Não se prenda ao amor. Ele mantém, mas não segura para sempre. A dedicação é uma forma de manter o amor em dia, contudo, dedicar-se não é entregar-se por completo. Não é preciso se anular para amar, é preciso ter consciência do amor próprio.

Ame, mas se ame mais. Se você deixa de fazer algo, uma vez, por causa de uma tarefa, você está se dedicando. Se você deixa de fazer algo, sempre, pois acredita que todo esforço será recompensado, provavelmente irá descobrir em um futuro próximo que a recompensa da entrega foi extraviada no caminho e você não receberá nada além do desgosto por não ter feito algo para si próprio. Para amar, é preciso degustar. Digerir sem mastigar torna o amor insosso.

Ame, mas saboreie. Saiba aproveitar o momento para amar as tarefas, o envolvimento, a entrega. E saiba aproveitar o lado pessoal, o prazer de executar algo para si próprio, de explorar todos os lados da paixão em qualquer âmbito da sua vida. Quem ama 360º não deixa de amar nunca.

Esqueça as férias permanentes. Trabalhe com o que você gostaria de amar.